domingo, outubro 24, 2010


Noite Muda-Tenebrosa

Ó noite, ó noite, ó muda-tenebrosa!
Tu que lançaste o pecado
Sobre esta carne pútreda, asquerosa,
Envolve-a no teu manto constelado,
Ó noite, ó noite, ó muda-tenebrosa

No escuro observo os segredos infamantes
Dos crimes ensanguentados
Segredos que são guardados
Como se guardam diamantes;

Vejo os sonhos maus invisíveis,
Os desejos subterrâneos,
Os monstros incoercíveis
Que habitam nos nossos crânios;

As vesgas concupisciências
Atrozes, brutas, carnais,
E forte como as essências
E duras como os cristais;

Os pensamentos obscenos,
Os crimes dos homens sérios,
As tragédias dos venenos
E as farsas dos adultérios;


As mentiras, as traições
As fundas hipocrisias,
As lepras dos corações
E os vermes das fantasias;

Tudo isto, ó pessoas que no momento me parecem um padre,
Foi parar nos teus ouvidos,
Esgotos apodrecidos
Do enxurro da humanidade.

Gente de faces sanguíneas,
O ventre ignóbil, rotundo,
Vai contar as ignomínias
Que viste por este mundo
às larvas negras, impuras
Para quem as sepulturas
Não têm portas,
Ás larvas frias que são
A alma da podridão,
A vida das coisas mortas.


Ó noite, ó noite, ó muda-tenebrosa!
Vou contando de minuto em minuto, de hora em hora,
Não sei se fico ou vou embora!

Quanto mais imerso
neste contexto sombrio,
mais detesto,
mais calafrio.

Ó noite, ó noite, ó muda-tenebrosa!